Desde que o Náutico havia perdido a classificação à Série A após a derrota para o Oeste no dia 26 de novembro, o Superesportes tentava uma entrevista com o técnico Givanildo Oliveira. Ele havia aceitado, mas estava resolvendo algumas pendências pessoais e a princípio a entrevista não tinha data certa, mas minutos após o contato que precedeu está entrevista o ex-técnico do Náutico retornou a ligação. “Acho que tenho que falar algumas coisas”, disse. Queria esclarecer o que aconteceu em 2016 dentro do clube, principalmente naquela partida e porquê não continuou no clube em 2017.
Pontualmente às 12h da última quarta-feira, Givanildo estava pronto para a entrevista. Não se limitou a falar do Náutico. Passagens por Paysandu, América-MG e Santa Cruz foram lembradas. Propostas de trabalho, outras demissões e a frustração de nunca ter ganho uma chance em um grande clube foram comentadas pelo treinador. Além disso, revelou que a tragédia da Chapecoense, na qual perdeu três atletas que havia comandado, e o medo de avião fizeram desistir de uma viagem que estava marcada há meses e o principal. Não pensa em parar.
Era claro que seu desejo era ficar no Náutico para 2017. O que o senhor queria falar sobre a sua saída do Náutico?
A saída ela é muito esquisita no futebol. E você com esse tempo todo que eu tenho, assim como muitos treinadores têm, não se acostumam nunca. Cada um a seu jeito. A gente estava falando (antes da gravação) de Belém. Trabalhei no Paysandu numa época entre 2000 e 2002, foram dois anos e meio de trabalho. Ganhamos os três campeonatos estaduais, a Copa Norte, a Série B, chegamos a uma Copa dos Campeões e ganhamos, que ninguém acreditava… Então, em dois anos e meio foram seis títulos. Começou o Brasileiro de 2002, com cinco jogos me mandaram embora por carta. Não me convidaram para ter uma conversa, nada. Mandaram uma carta. Quando abri estava dizendo que estava liberado, que não dava mais certo. Você vê, com tudo o que se ganhou. Não se acostuma. Se algum treinador disser que está acostumado quando manda embora, não está. É mentira. É dureza de aceitar. Você vai para um time que está beirando os quatro de baixo e faz uma campanha com, pelo o que dizem aí, vocês (imprensa) são bons nisso, com quase 70% de aproveitamento e para mim, que conheço a Série B, (esse aproveitamento) é para ser campeão. Fica uma especulação na rua, a imprensa, que fala algumas coisas, mas na verdade o fundo da verdade ninguém sabe. Você não pode de repente estar ganhando um salário X e tirar 70% desse salário. Aí é muito. Então, infelizmente não deu certo porque acho que não existia uma unanimidade quando eu fui. Não conquistamos o acesso, que em vez de seis eu passaria para sete. Ninguém mais do que eu queria ganhar. O problema é que nem sempre você joga bem e aconteceu de jogar mal na partida principal, que era a do acesso. E aí começam as especulações, a se falar muita coisa. O futebol só perde para a política. A política é pior que o futebol nesse sentido de boato, de dizer uma coisa sem confirmar, sem saber as verdades.
O que foi de verdade nessa saída?
A verdade foi esta: fizeram a proposta muito abaixo, mas essa proposta pela minha vivência no futebol foi em cima daquilo ‘que vamos fazer assim que ele não vai aceitar e pronto’.
O senhor chegou a dar a resposta?
Não (cheguei a dar a resposta). Comprovaram isso que estou dizendo.
Vazou a informação que na partida do Oeste o senhor queria substituir ao menos sete jogadores contra o Oeste. Isso é verdade?
Se pudesse (substituiria sete), sim. Tentei dar uma sacudida no grupo. Ainda disse que não faria as três porque eu iria segurar um.
O que aconteceu naquele jogo do Oeste?
Futebol não tem explicação. Com a caneta, vocês (repórteres) erram e depois podem corrigir. Futebol não tem essa. Futebol não é salão e posso mudar o time todo. Uma vez disse a comentarista de rádio que é muito bom comentar jogo de sete da noite do domingo. Mas e o antes? Tem que acompanhar o trabalho e entender o que acontece. Tem treino, tem cabeça de jogador. Só pude contratar um jogador que foi o Marco Antônio. Jogamos sem um atacante fixo. Tivemos a volta do Mamute e depois do Tiago, que se machucou na reta final. Fizemos uma boa campanha. Não foi uma bela campanha.
Teve algo de atípico na semana da preparação?
Não teve nada de atípico naquela semana. Tivemos um lance, que todos vocês sabem, com o Vinícius porque ele foi substituído contra o Tupi e não gostou. Ele pediu desculpas obrigado por mim. Ele veio me pedir desculpas, mas ele tinha que pedir aos companheiros, que entraram no jogo.
A diretoria foi bem dura com os jogadores após a partida e os culpou por continuar na Série B. Você concorda?
Falando assim foi pelo o que jogou mesmo, mas nunca deixei de assumir a minha culpa.
Eu assumo minha culpa. Fui um dos mais prejudicado por conta do meu currículo. Nunca fui para uma entrevista para colocar a culpa em alguém. O time não foi bem.
Chegou a conversar com algum jogador pensando em 2017?
Não. Não converso com jogador porque tinha que esperar o Náutico. Imagina se falo com alguém e não acerto nada com o clube?
De alguma forma você se sentiu injustiçado pela diretoria do Náutico?
Não, sabe por quê? Essa parte de injustiça estou calejado. O que acontece é o seguinte, a injustiça no futebol ela acontece com o treinador e não é só comigo. Foi treinador é difícil. Mas você não pode ficar ligado a isso, não quer, não quer. Manda embora. Mesma coisa já aconteceu comigo, por exemplo, que estava em um time, apareceu outro time e resolvi ir por uma série de motivos. Acharam ruim. E quando querem mandar embora não acham ruim, mandam a hora que quer e como quer. São situações. Tive com o América-MG, por exemplo. Fomos campeões estaduais depois de 15 anos em cima de Atlético e Cruzeiro. Só Robinho ganhava a nossa folha. E daí? Começou o Brasileiro e no quinto jogo me mandaram embora. Não aceito, mas tenho que conviver com isso. Todo treinador tem que conviver com isso e sabe que é assim.
Como você viu essa queda do América-MG. Você acha que se tivesse ficado poderia ter sido diferente?
Não sei te dizer. Foi no quinto jogo que me me mandaram embora. Faltavam 33 jogos ainda. Podia não ter caído, mas poderia ter caído pela situação de montagem do grupo. O América tem um problema de renda. Você não vê 15 mil pessoas no estádio. Dá 2.800, 3 mil pessoas. O América não tem condições de contratar cinco seis jogadores de peso. O América sempre teve uma base boa. Quando fui campeão em 1997, tínhamos 12 jogadores da base. Irênio, Evanílson, Ricardo, Fabrício e Gilberto Silva, que foi para a Seleção. Esse jogadores subiram comigo e mostraram porque tinham condições de subir. Falei isso para o Náutico. Tem que investir mais na base para tirar mais dali.
O Náutico está falando muito em utilizar mais a base e isso pode ter sido um motivo para você ter saído?
Não sei. Mas tive uma conversa muito boa com Emerson Barbosa sobre isso. Estávamos utilizando os meninos do sub20 em alguns treinos. Já tinha até planejado de subir alguns. Cada treinador tem seu estilo de trabalhar e acredito que eles vão utilizar, sim mais a base.
Você sempre sonhou com um título pelo Náutico. Será que com essa sua saída isso ficará impossível?
Nunca vou dizer que não porque futebol só perde para política. Dá muitas voltas. Nunca falou que não vou para nenhum lugar, mas também depende da condição de trabalho.
O senhor sempre falou que nunca teve chance em um grande clube do eixo Rio-São Paulo e sempre reclamou disso. O que acha contribuiu para isso nunca ter acontecido?
Preconceito. Já falei isso ao vivo. Uma vez falei isso no Cartão Verde da TV Cultura. Com o jogador do lado de cá (Nordeste), não tem. Se tem é muito pouco. Mas com treinador tem. Qual é o treinador nosso que já foi para time de ponta? Isso eu posso bater no peito. Digo e repito aonde eu estiver falando. É preconceito sim. Tem treinador que aparece do nada e assume time de ponta. Porque eu não poderia? Ainda mais pelo trabalho que eu fiz, principalmente em Série B. Muricy foi para time ponta porque veio para o Náutico. Ele saiu de auxiliar de Telê e veio para o Náutico. Ganhou dois campeonatos e foi para o Internacional. Eu ganhei mais de 300 campeonatos e nunca tive essa situação.
O senhor foi técnico do Atlético-PR, que foi a situação mais próxima de um time de ponta, como foi essa experiência?
Fui para lá através de Nivaldo, um empresário. Ele me indicou após ser campeão com o Santa Cruz. Apareceu o convite e fui sabendo como era a condição. Tem muita gente que pensa que eu não falo com diretor e que sou chato. Mas não é ser chato. Você querer a coisa certa não é ser chato. Ele (o fotógrafo) passou mais de 20 minutos arrumando a câmera para que saísse tudo certo. Ele é chato? Eu só quero tudo certo. Eu quero os horários direitinhos, um gramado bom, uma viagem antecipada. Quero tudo certo para tirar o melhor dos jogadores. Tem gente que não entende. Eu converso com quem quer conversar comigo.
Você teve seu nome ventilado recentemente no Arruda. Chegou alguma proposta do Santa Cruz?
Ninguém me contactou. Eu não fujo do trabalho. Se achar que devo ir, eu vou. Agora também não fico em canto nenhum se não achar que vai dar para trabalhar. Se acontecer uma chamada, um acerto, claro que vou. Só não vou para nenhum quando eu parar. Quem acha que eu vou parar, está enganado. Está um pouco longe.
O senhor está com 68 anos e não pensa ou estipula quando vai parar?
Não pensei ainda em algo tipo ‘vou parar quando tiver 70’ ou “vou até 72’. Mas na minha cabeça eu sei. Vai acontecer um momento que não estarei fazendo o que eu quero com gosto. Claro que vou sentir quando parar. Alguns dizem e escrevem que eu tenho que parar. Há uns dois anos atrás, quando estava no ABC, um colunista escreveu que eu tinha que parar. Que eu já estava passado. Eu tava com 65 e lembrei que da primeira vez que fui para o ABC ele já escrevia. Qual a idade dele? Descobri que ele tinha 75 anos e na primeira coletiva devolvi ‘soube que tem um colunista que está metendo a porrada em mim, falando que eu tenho que parar, mas ele está escrevendo com 75 anos’. Você só apanha, apanha e tem hora que tem que revidar.
O senhor parou de jogar e teve 699 jogos pelo Santa Cruz. Se te convidassem para jogar cinco minutos e completar esses 700 jogos, você iria?
Eu não sou muito chegado a essas coisas. A prova é que teve um dia que um vizinho me perguntou porque eu corria para o vestiário. Perguntei se ele queria que eu desse volta olímpica. Não tenho que estar subindo em carro e estar colocando braço para cima. Só disse que ele não sabia a alegria que eu sinto por dentro. Meu jeito é esse.
Sobre atualização, já que disseram que você é atrasado. Como é seu dia a dia quando não está treinando?
Primeiro, eu acho frescura esse negócio de ir para a Europa aprender. Só vou deixar de achar frescura quando alguém passar o Brasil. Quem tem mais título mundial? O Brasil. Você vai em qualquer time da Europa, tem quatro, cinco brasileiros. Por que eles vem buscar aqui? Você tem que aprender com Atlético-GO, que pra mim foi um time foi superior. Esse time (Oeste) que jogou com a gente no final, estava com o time todo atrás, mas quando saía era com seis jogadores. Não era dois, três. Eram seis. A gente aqui aprende. Não precisa ir para lá não.
Tem algum treinador novo que você apostaria que terá sucesso. Algum como Fernando Diniz que você acabou de citar?
Pode ser sim. Ele (Fernando) tem uma maneira de colocar o time dele para jogar. Não gosto de falar muito de treinador, mas esse lance do goleiro e do zagueiro ir jogando não existe. É um treinador que tem futuro. O Roger (Machado) também.
E Tite na Seleção Brasileira?
Ele tem uma coisa muito boa que é grupo. Eu tenho sempre essa vantagem. Vocês foram prova. Quando cheguei o grupo do Náutico estava, estava (desunido), né? E eu consegui juntar. Tite faz isso. Tem os jogadores do lado dele. Eu falo para os jogadores que quando eu tiver força na CBF e levarem para Fifa, jogarão 15. Joga todo mundo. Mas como são 11, vocês procurem fazer o melhor para jogar. Quem não for jogar pode ficar de beicinho e raivinha, mas tem que dar o melhor.
Baseado nisso, você acha que é preciso mudar algumas regras no futebol, como substituições ilimitadas, por exemplo?
Ilimitadas não, mas vamos pensar em números. Hoje você leva 23 jogadores para o jogo. São 12 no banco de reservas. Na minha época podia levar cinco para o banco e substituir dois. Veio a evolução de ter esses jogadores a mais e continua só trocando três. Como aumentou o banco, poderia aumentar a quantidade trocas. Deveria ir para cinco e acho que continuar assim é um erro grave.
Como você acompanhou a tragédia da Chapecoense?
Foi muito triste. Algo que ocorreu pela irresponsabilidade do cara (piloto). Tinha o Josimar, Cleber e o Kempes que trabalharam comigo. Um dos jogos que ainda fiz com o América-MG na Série A foi com eles (Chapecoense venceu por 3 a 1). É lamentável.
O senhor, que viaja muito de avião, ficou mais apreensivo após o acidente?
Eu sou medroso mesmo. Tenho pavor (de avião). É meu trabalho e tenho que ir. Eu tenho tanto medo que tinha uma viagem marcada para Belo Horizonte. Depois disso desmarquei tudo. Tem que dar um tempo.
Tem alguma negociação com algum clube?
Tive com o Vila Nova-GO, mas não avançou. Teve contato, mas até agora nada. Vamos curtir as férias e ver o que acontece.